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  • Foto do escritorMarcio Both

As lutas históricas dos indígenas na região Oeste do Paraná. Os Avá-Guarani de Santa Helena

A dissertação de mestrado desenvolvida por Nilva Zimmermann aborda um tema de grande relevância social, política e acadêmica. Da perspectiva social, cumpre papel importante no sentido de contar uma história ainda pouco conhecida e muito silenciada, especialmente em relação a região que é o foco de sua abordagem, o oeste do Paraná.


Politicamente, em um tempo de negacionismo, de relativização e questionamento das histórias e causas indígenas, em que assistimos a dizimação de populações inteiras na região amazônica, tempo que espera-se ter sido superado, a dissertação de Zimmermann alerta para o fato de que no contexto da região estudada, existem populações indígenas guaranis que encontram-se em situação fragilizada e que, em algum sentido, os problemas que têm enfrentado são semelhantes aqueles vividos pelos grupos Yanomami da Amazônia. Ainda no universo da sua importância política, a pesquisa conta a história do quanto a Usina Hidrelétrica Binacional Itaipu tem uma dívida histórica para com as populações indígenas e camponesas do Paraná. Por fim, academicamente, ainda que nesse aspecto a dissertação apresente algumas fragilidades, a pesquisa de Zimmermann cumpre a tarefa de preencher uma lacuna existente na historiografia regional que muito pouco abordou a questão indígena, sua história, sua importância e os diferentes legados que essa presença tem na região e no estado como um todo.


A dissertação está elaborada em 3 capítulos, os quais se complementam e permitem uma experiência de leitura bem articulada que vai da presença histórica dos indígenas na região, desde tempos imemoriais, passa pelas lutas e situações vividas quando as suas terras se tornaram foco do interesse de incorporação da sociedade nacional. Nessa caminhada, alcança o momento em que a Usina Hidrelétrica de Itaipu virou uma realidade e demonstra os impactos que esta presença teve em relação aos indígenas e as outras populações que viviam no local, especialmente as camponesas. Por fim, no terceiro capítulo, aborda mais diretamente as lutas atuais travadas pelos indígenas que vivem na terra indígena Avá-Guarani chamada Tekoa Vy‘A Renda, localizada no município de Santa Helena, Paraná.


Esse Tekoa (lugar de viver e de ser na cosmovisão Guarani), existe desde 2008, é conformado por cerca de 35 famílias (107 pessoas) que vieram de outras terras indígenas localizadas no estado do Paraná. Ele é composto por cerca de 7 alqueires (quase 17 hectares) e está localizado em área pertencente a Itaipu, que há tempos vem buscando expulsar os guaranis desse local. Por sua vez, os indígenas exigem o reconhecimento daquela área como sua e a ampliação dela como forma de garantir condições de vida aos seus habitantes. Trata-se de uma luta histórica, uma vez que no processo de construção da Itaipu e da formação do lago que movimenta as suas turbinas, alguns tekoas existentes na região foram alagados e os indígenas que neles viviam foram, compulsória e independentemente de suas vontades, transferidos para outros aldemamentos do estado. Alguns dos indígenas que hoje formam o Tekoa Vy ‘A Renda são descendentes ou antigos moradores do Tekoa Dois Irmãos e de outros tekoas que existiam na região do município de Santa Helena e que foram submersos pelo lago da usina.



Assim, eles lutam pelo reconhecimento da ancestralidade de sua presença na região e, para tanto, desde 2008 até hoje vem enfrentando uma série de dificuldades, seja pela pequena quantidade de terras ocupadas, fato que não lhes garante condições de bem viver de acordo com suas tradições e costumes. Diante disso, dependem muito diretamente dos esparsos investimentos públicos locais (doação de cestas básicas, acesso a saúde e educação, por exemplo) ou buscam garantir sua sobrevivência procurando trabalho nas empresas sediadas na região, principalmente frigoríficos. Além disso, enfrentam a resistência da Itaipu em reconhecer sua luta histórica, a falta de políticas públicas voltadas para atender as suas demandas e os preconceitos de parte da população não-indígena local em relação a eles e a sua presença.


Além de abordar estas questões, didaticamente a escrita de Zimmermann se destaca, pois ela produz um texto de fácil leitura que tranquilamente poderá ser usado em diferentes contextos de aprendizagem para contar a história dos Avá-Guarani na região, de modo especial em Santa Helena/PR. A autora, da mesma forma, traz uma série de imagens que ajudam na compreensão da mensagem que o texto quer passar e, de modo especial, é provocativo na direção de demonstrar a responsabilidade histórica do Estado Nacional, via Itaipu, e da população local em relação a algumas desigualdades sociais e econômicas vigentes na região, as quais ganham expressão ainda mais dramática na situação vivida pelos indígenas que são foco de sua análise. Portanto, um texto que merece ser lido e difundido pela região e por outros locais do país a fim de que possamos conhecer a história dos indígenas brasileiros e das lutas históricas que vêm travando para garantir condições para que continuem existindo e realizando suas identidades e cosmovisões.



Referência Bibliográfica

ZIMMERMANN, Nilva Lenz. A luta pela retomada da terra dos Avá-Guarani no oeste do Paraná: o caso do Tekoha Vy’A Renda. Dissertação de Mestrado. Marechal Cândido Rondon: Programa de Pós-graduação em História da Unioeste, 2023.

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